"Tudo palpita em redor de nós, e é como um dever de amor aplicarmos o
ouvido, a vista, o coração a essa infinidade de formas naturais ou
artificiais que encerram seu segredo, suas memórias, suas silenciosas
experiências. A rosa que se desprende de si mesma, o espelho onde pousa o
nosso rosto, a fronha por onde se desenham os sonhos de quem dorme,
tudo, tudo é um mundo com passado, presente, futuro, pelo qual
transitamos atentos ou distraídos. Mundo delicado, que não se impõe com
violência: que aceita a nossa frivolidade ou o nosso respeito; que
espera que o descubramos, sem se anunciar nem pretender prevalecer; que
pode ficar para sempre ignorado, sem que por isso deixe de existir; que
não faz da sua presença um anúncio exigente “Estou aqui! Estou aqui!”.
Mas, concentrado em sua essência, só se revela quando os nossos sentidos
estão aptos para o descobrirem. E que em silêncio nos oferece sua
múltipla companhia, generosa e invisível.
Oh! Se vos queixais de solidão
humana, prestai atenção, em redor de vós, a essa prestigiosa presença, a
essa copiosa linguagem que de tudo transborda, e que conversará
convosco interminavelmente."
Cecília Meireles, em Escolha o Seu Sonho.